23 de outubro de 2025

Ibovespa fecha em alta e desafia o cenário externo: como a resiliência local pode abrir novas oportunidades em ações brasileiras

O fechamento do Ibovespa hoje revelou uma força surpreendente do mercado brasileiro, mesmo diante de uma tempestade internacional nos juros, mostrando como catalisadores internos e setoriais podem redesenhar o mapa das melhores oportunidades para quem investe em ações.

No fim da tarde, o Ibovespa encerrou o pregão aos 145.721 pontos, após oscilar entre a mínima de 144.881 e a máxima de 146.358, com um volume negociado de R$ 20,31 bilhões. A alta de 0,59% consolidou o viés positivo semanal e mensal, sustentado por movimentos consistentes nas médias móveis e indicadores técnicos. O que me chamou atenção, confesso, foi a maneira como o mercado local parecia “filtrar” o pânico externo, focando nas próprias cartas e jogando com um inesperado otimismo. Em dias assim, me lembro de uma velha lição de mesa de operações: às vezes, a diferença entre ganhar e perder está em quem enxerga o ruído e quem ouve a música por trás dele.


Por trás dessa performance, dois blocos de influência se destacaram. Do lado externo, o avanço expressivo do petróleo Brent — mais de 5% — foi decisivo, impulsionado por sanções dos EUA contra grandes petrolíferas russas no contexto da guerra na Ucrânia. Essa disparada mundial do petróleo imediatamente favoreceu ações da Petrobras, que carregam enorme peso no índice e fecharam o dia em alta (PETR4 +1,14%, PETR3 +0,72%). Ao mesmo tempo, o setor de energia foi destaque global, sustentando bolsas como o S&P 500, que avançou na mesma magnitude do Ibovespa. No entanto, o pano de fundo internacional era tudo menos tranquilo: os juros dos Treasuries americanos (2 e 10 anos) saltaram mais de 130 pontos-base, um choque que em geral provocaria fuga de capital de mercados emergentes. Só que, desta vez, o Brasil nadou contra a corrente.


A explicação para esse descolamento está nos fatores internos. Apesar do estresse nos juros globais, a curva de DI no Brasil caiu nos vértices médios e longos (DI27 -4 bps, DI29 -8 bps), sinalizando redução da percepção de risco doméstico. Essa melhora foi alimentada por expectativas de inflação mais controlada (com o IPCA-15 no radar) e anúncios de avanço nas medidas fiscais pelo Ministério da Fazenda, que reforçaram a confiança na responsabilidade fiscal. O dólar recuou frente ao real, mesmo com o DXY estável, sugerindo fluxo positivo ou menor aversão ao risco local. Ou seja, enquanto lá fora o medo dominava os bond traders, por aqui o mercado enxergou brechas para apostar em uma “virada de chave” no risco Brasil. A alta do Ibovespa, portanto, não foi mero reflexo do petróleo — ela foi sustentada por uma convicção técnica de que o cenário doméstico merecia ser reprecificado para cima.


A leitura técnica do pregão reforça esse argumento. Com alta firme, todas as tendências — diária, semanal e mensal — permanecem positivas, ancoradas em médias móveis e confirmadas por indicadores de momentum como RSI e MACD. O sinal mais intrigante, no entanto, foi a impressionante divergência entre o comportamento dos juros brasileiros e americanos: enquanto o mercado global de títulos sangrava, o DI local recuava. Esse descolamento, raríssimo em dias tão agudos de estresse externo, sugere que o mercado identificou uma assimetria relevante no risco Brasil, precificando uma melhora estrutural à frente. Além disso, houve uma convergência de apetite por risco: tanto o Ibovespa quanto o S&P 500 subiram em compasso, enquanto o VIX recuou quase 7%, sinal de otimismo elevado e baixa aversão ao risco. Se por um lado a complacência aparente do VXBR (fechando em 14,33, queda de 1,65%) pode ser vista como um alerta para possíveis reversões, por outro, ela escancara o quanto o mercado está confortável — talvez até demais — com o cenário local.


Olhando para frente, faço uma provocação: quando o ambiente parece tão resiliente diante de choques externos, isso representa solidez genuína ou estamos diante de um otimismo que pode se mostrar frágil? O comportamento dos DIs longos hoje — com fechamento do spread entre 2029 e 2025 em 7 bps — mostra que parte relevante dos investidores apostou em um ciclo de cortes de juros mais prolongado ou profundo, ancorado em expectativas fiscais positivas. Se esse pano de fundo se confirmar, o Ibovespa pode encontrar espaço para uma continuação de alta, sobretudo se o fluxo estrangeiro persistir e a agenda doméstica seguir avançando na direção da disciplina fiscal. Mas, como sempre, a complacência pode ser traiçoeira: uma decepção nos dados fiscais ou um novo choque externo no apetite por risco pode inverter rapidamente a maré. Em resumo, o cenário sugere que a “música” do otimismo doméstico segue tocando, mas é preciso atenção à possibilidade de que, em algum momento, o ruído volte a dominar.


Diante desse contexto, a abordagem de alocação que destaco hoje se ancora justamente na divergência entre a curva de juros local e a tempestade externa, utilizando o Quarteto Estratégico para ilustrar como pensar taticamente sobre oportunidades assimétricas. O argumento consensual de cautela (“bear case”) gira em torno do risco de contágio: se os juros americanos continuam subindo e a economia global desacelera, ativos brasileiros tenderiam a sofrer, principalmente os setores sensíveis a crédito e fluxo estrangeiro. No entanto, a tese alternativa — que hoje se fortaleceu — é a de que o mercado local já antecipou parte desses riscos, e que o prêmio de risco doméstico está sendo reprecificado para baixo. O potencial de ganho está, portanto, em se antecipar a um ciclo de fortalecimento relativo do Brasil, especialmente em setores que se beneficiam do alívio nos juros de longo prazo e da melhora fiscal.


O gatilho objetivo para essa tese é o fechamento consistente do DI2029 abaixo dos níveis recentes, acompanhado de manutenção do Ibovespa acima da máxima intradiária de hoje (146.358 pontos). Esses são sinais de que o mercado está disposto a comprar o “novo” risco Brasil, mesmo sem a ajuda do exterior. A execução prática da estratégia seria aumentar taticamente a exposição em setores sensíveis à queda dos juros e à normalização fiscal, como bancos, utilities e empresas ligadas ao consumo doméstico, além de manter exposição tática em Petrobras, que segue beneficiada pelo cenário do petróleo. Por outro lado, a proteção da posição deve ser disciplinada: a perda da mínima do dia (144.881 pontos) ou uma reversão abrupta na curva de juros (com DI2029 voltando a subir forte) seriam sinais claros para reduzir a exposição e buscar proteção em ativos defensivos ou mesmo em instrumentos de hedge, como opções de venda. Em suma, trata-se de uma estratégia que busca capturar o prêmio de um descolamento positivo do risco Brasil, mantendo o risco de reversão bem delimitado — como quem aposta no “som da música”, mas já está de olho no botão do volume, pronto para ajustar se o tom mudar.


No fim das contas, operar mercados é como atravessar um rio de águas turvas: não basta saber nadar, é preciso sentir a correnteza sob os pés. Hoje, o Ibovespa mostrou que, mesmo quando a superfície parece calma, há forças contraditórias em jogo. O investidor atento é aquele que aprende a distinguir entre o reflexo na água e a direção do fluxo — e que sabe que, mais importante do que antecipar o próximo passo, é desenvolver a sensibilidade para perceber quando o chão começa a mudar.

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