Juros Futuros Recua e Curva de DI Abre Espaço para Queda da Selic: Oportunidade à Vista em Prefixados e Estratégias de Alocação
O fechamento da curva de juros futuros hoje apontou para um novo ciclo de expectativas: o mercado já desenha no radar a antecipação de cortes na Selic, criando uma janela estratégica para repensar posições em renda fixa e capturar oportunidades de assimetria em títulos prefixados.
Quando olho para o pregão desta sexta-feira, vejo muito mais que números piscando no telão. O pano de fundo é uma reconfiguração rápida de sinais: taxas longas despencando, expectativas mudando de patamar e aquela sensação de que, em certos dias, o mercado resolve “reprecificar o futuro todo de uma vez”. Hoje, os principais vencimentos do DI traduziram isso em movimentos expressivos: o contrato para out/2026 caiu 39 bps (fechando a 14,14%), out/2027 cedeu 57 bps (13,215%), out/2028 desabou 73 bps (13,02%) e out/2029 caiu mais 61 bps (13,155%). O vértice mais curto, nov/2025, destoou, subindo levemente 3 bps (14,906%) — um detalhe que, para mim, carrega nuances interessantes sobre o que está na cabeça dos investidores. É como se o mercado dissesse: “No curtíssimo prazo, cautela. Mas lá na frente, o relógio da Selic vai girar mais rápido para baixo.” Lembro de um gestor veterano me dizendo certa vez: “Em dias assim, quem dorme de olho aberto percebe onde o consenso cochila.” E hoje, o consenso parece ter sido pego de surpresa por uma combinação rara de fatores.
O gatilho não veio de um só lado. Externamente, o CPI americano de setembro subiu só 0,3%, abaixo do esperado, e isso reanimou as apostas de que o Fed pode cortar juros antes do imaginado. O efeito dominó foi imediato: os yields de dois anos nos EUA caíram 31 bps, um tombo que abriu espaço para a valorização de ativos de risco mundo afora e, por tabela, aliviou a pressão sobre emergentes como o Brasil. Mas foi o IPCA-15 doméstico, com alta de apenas 0,18% contra as expectativas de 0,24%-0,25%, que realmente roubou a cena. O dado reforçou a narrativa de desinflação mais rápida, jogando as expectativas para cortes da Selic já em janeiro de 2026 — algo que, até ontem, parecia distante. Mesmo assim, não foi um dia sem ruídos: enquanto os juros futuros tombavam, o dólar fechou em leve alta (+0,09%), mostrando que, no mundo real, nem sempre todos os sinais apontam na mesma direção. Esse tipo de desconexão, aliás, serve de lembrete sobre a importância de olhar para o conjunto da obra antes de tirar conclusões precipitadas.
Na leitura técnica, a curva de juros apresentou movimentos dignos de nota em praticamente todos os trechos. No curto prazo, a inclinação entre nov/2025 e out/2026 (spread de -76,60 bps) aprofundou seu patamar negativo em 6 bps, sinalizando que, apesar do otimismo com a inflação, o mercado ainda vê o Banco Central mantendo a postura “parado no curto”, sem pressa para iniciar cortes imediatos. Esse flattening indica uma precificação de estabilidade ou, no máximo, uma transição cautelosa — há prudência, não euforia. No médio prazo, entre out/2026 e out/2027, a inclinação se tornou ainda mais negativa (-92,50 bps, variação de -2,00 bps), reforçando que o mercado vê espaço para cortes ao longo do ciclo, mas numa cadência que depende do avanço (ou não) da desinflação e do cenário fiscal. Já no longo prazo, o spread entre out/2028 e out/2029 subiu para +13,50 bps (alta de 1,50 bps), numa rara “empinada” (steepening) na ponta longa, mesmo após quedas acentuadas nas taxas absolutas. O que isso sugere? Que boa parte do prêmio de risco embutido nos vértices longos está sendo rapidamente reavaliada — mas não totalmente eliminado —, talvez porque o mercado queira ver mais provas de que o risco fiscal será domado no médio/longo prazo. No desenho geral do dia, a curva assumiu uma forma de “curva em barriga” (belly), com quedas mais acentuadas nos vértices intermediários e longos, mas sem inverter completamente a inclinação no final. Isso reforça a mensagem de transição: o consenso de Selic alta e longa foi desafiado, mas não sumiu; há uma reprecificação em curso, aberta a revisões rápidas caso surjam novos choques.
Diante desse quadro, o movimento de hoje criou um dilema interessante para o Banco Central. De um lado, a queda acentuada dos DIs longos sugere que o mercado está antecipando cortes mais cedo, pressionando o BC a não ficar “para trás” na largada do ciclo de afrouxamento. De outro, a resistência dos vértices curtos e a leve alta do dólar mostram que parte dos agentes ainda exige prudência — seja pelo risco fiscal, seja por temores de que choques exógenos (câmbio, commodities) possam reverter a tendência benigna. Na prática, a precificação da curva indica que, se a desinflação continuar surpreendendo para baixo e o Fed aliviar o ritmo nos EUA, o espaço para cortes da Selic se abre já no início de 2026. Porém, qualquer tropeço fiscal ou surpresa negativa no câmbio pode esfriar esse otimismo rapidamente, reacendendo a demanda por prêmio de risco, especialmente nos vértices longos. Ou seja, seguimos num cabo de guerra entre o alívio inflacionário e as incertezas do quadro fiscal, com o mercado testando os limites da paciência do BC.
Pensando em estratégias de alocação, a assimetria do dia está na própria divergência entre o ritmo de queda dos juros futuros e o comportamento do câmbio. O argumento contrário — e que vem dominando parte do consenso — é que a alta do dólar e o risco fiscal elevado ainda impõem um teto para quedas adicionais nas taxas longas, tornando arriscado travar taxas prefixadas agora. Minha leitura é que esse argumento já está parcialmente refletido nos preços: a magnitude da queda dos DIs longos, mesmo em um dia de dólar firme, sugere que o prêmio de risco doméstico vinha exagerado e começou a ser corrigido. A oportunidade está justamente aí: para investidores que buscam assimetria, aumentar a exposição a títulos prefixados de médio e longo prazo pode ser uma jogada taticamente interessante. O gatilho para a materialização dessa tese passa por dois fechamentos consecutivos de queda nas taxas longas (DI29, por exemplo, abaixo de 13,00%), reforçando que o fluxo comprador está sustentado e não é apenas um soluço pontual. Na prática, isso pode ser operacionalizado via Tesouro Prefixado 2029 ou mesmo títulos de crédito privado AAA de duration média, que tendem a capturar ganhos relevantes caso o movimento de fechamento se consolide. A disciplina de saída — fundamental em qualquer cenário assimétrico — deve estar ancorada na vigilância sobre o câmbio e o risco fiscal: se o dólar retomar alta significativa (ex: acima de 2% em poucos dias) e a curva longa voltar a abrir, é hora de reavaliar e, se necessário, realizar lucros parciais nos prefixados, migrando parte da carteira para pós-fixados ou IPCA+ curtos, que oferecem proteção em cenários de reversão.
Resumindo o racional: a janela de oportunidade em títulos prefixados se abre quando o prêmio de risco doméstico começa a se normalizar, mas ainda há gordura deixada pela precificação pessimista anterior. O risco não desapareceu — ele apenas ficou mais explícito, e por isso a assimetria de retorno pode ser capturada se o investidor agir com disciplina.
Ao final de um dia como este, vale lembrar: o mercado de juros é uma espécie de espelho distorcido do futuro — reflete, amplia e às vezes esconde o que está por vir. O segredo está em olhar para além do reflexo imediato e, como num bom jogo de xadrez, pensar alguns movimentos à frente. Afinal, em finanças, quem só reage às peças no tabuleiro raramente captura as melhores oportunidades.
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