3 de outubro de 2025

Juros Futuros e o Sinal do Bear Steepening: O Que a Curva de DI Está Gritando Sobre Risco e Estratégia em Renda Fixa

Quando a curva de juros acentua o desnível entre prazos, o investidor atento descobre mais do que simples números: aprende a escutar os sinais de um mercado que recusa promessas vazias e exige prêmio elevado para navegar no longo prazo.

Numa sexta-feira que começou já sob o peso dos Treasuries americanos em alta — e terminou com a curva DI brasileira ainda mais “íngreme” —, os contratos de juros futuros fecharam em terreno de bear steepening. O destaque ficou para a abertura mais aguda dos vértices longos: DI out/2026 subiu para 14,355% (+0,07%), out/2027 disparou para 13,63% (+0,37%), out/2028 ficou em 13,445% (+0,30%) e out/2029 avançou para 13,50% (+0,19%). O curto prazo (nov/2025) permaneceu praticamente estável (14,909%), evidenciando que a pressão se concentrou mesmo nos prazos mais longos. Esse padrão, que para mim sempre remete àquelas vezes em que o mercado parece repetir em tom mais alto aquilo que já vinha sussurrando, deixa claro: a curva está cobrando caro para confiar no futuro fiscal.


Há dias em que a explicação é quase monocromática — tudo sobe ou tudo cai —, mas hoje o quadro foi de contrastes. O pano de fundo global trouxe o primeiro tom: os juros dos Treasuries americanos subiram, elevando o custo de capital pelo mundo e obrigando os mercados emergentes a reprecificarem seus riscos. No Brasil, esse movimento externo foi imediatamente amplificado por ruídos fiscais domésticos: a incerteza sobre o compromisso com o ajuste das contas públicas adicionou um prêmio extra aos vértices longos do DI, exigindo taxas maiores para compensar o medo de deterioração fiscal ou intervenções políticas que possam colocar em xeque a credibilidade da política monetária. É como se cada notícia sobre dívida ou meta fiscal ecoasse ao longo da curva, tornando o futuro mais caro para todos.


Ao destrinchar tecnicamente os spreads, a história ganha ainda mais nuances. No trecho curto (out/2026-nov/2025), o spread permaneceu negativo, mas com leve redução (-55,40bps, alta de 1,00bps): um steepening tímido, que sugere que a pressão inflacionária de curto prazo — reforçada por uma produção industrial acima do esperado — ainda não é suficiente para inverter totalmente as apostas de corte de juros nas próximas reuniões do Copom, mas já coloca um freio na expectativa de flexibilização agressiva. No médio prazo (out/2027-out/2026), o steepening foi mais robusto (+4,00bps): aqui, a curva revela que o mercado já começa a reavaliar o ritmo de queda da Selic ao longo do ciclo, projetando que o caminho de desinflação pode ser mais longo e sinuoso. Na ponta longa (out/2029-out/2028), porém, o spread diminuiu (-1,50bps), mas ainda se mantém positivo, consolidando a inclinação da curva: o prêmio de risco de longo prazo segue elevado, refletindo o medo estrutural de que o ajuste fiscal não venha — ou venha tarde demais. O formato resultante é de uma curva “steep”, com acentuada diferença entre os curtos e longos, típica de mercados que não compram a narrativa de melhora fiscal e exigem gordura extra para emprestar em prazos longos. Não é o retrato de um mercado otimista: é o de quem prefere errar pelo excesso de cautela.


O que mais chama atenção hoje é justamente a tensão entre o esforço do Banco Central — que continua intransigente na manutenção de juros altos para conter inflação — e o movimento da curva, que parece gritar que a tarefa de domar o risco fiscal está fora do alcance apenas da política monetária. Se em outros momentos o BC bastava para tranquilizar a curva, agora a mensagem é clara: sem sinais concretos de responsabilidade fiscal, nem mesmo a postura hawkish é capaz de ancorar as expectativas de longo prazo. O mercado precifica a possibilidade de cortes de juros cada vez mais tímidos e distantes, enquanto o prêmio de risco estrutural se impõe. Se o cenário fiscal persistir ou piorar, é provável que a inclinação da curva se mantenha ou até se acentue; já um alívio fiscal genuíno poderia, com o tempo, permitir um flattening — mas isso exige mais do que promessas, requer ação e credibilidade.


Pensando em alocação, a mensagem da inclinação bear steepening pode ser vista como um convite à estratégia de barra (“barbell”), aquela velha conhecida dos mercados voláteis. Concentrar a maior parte do portfólio em pós-fixados de alta liquidez — como Tesouro Selic ou CDBs curtos — ajuda a capturar o alto carrego dos juros ainda elevados e protege contra surpresas negativas de curto prazo, já que esses títulos são pouco sensíveis a oscilações da curva. Por outro lado, destinar uma fatia menor a títulos prefixados ou atrelados à inflação de vencimento muito longo (Tesouro Prefixado 2029+ ou Tesouro IPCA+ 2035+) pode ser uma maneira de se expor ao prêmio adicional embutido nas taxas longas, apostando que, caso haja alguma melhora fiscal inesperada, esses papéis podem valorizar de forma mais acentuada. Essa abordagem, que costumo ver como um jeito de “jogar dos dois lados do campo”, se justifica especialmente quando a curva está tão inclinada, pois permite capturar o retorno dos extremos enquanto evita o risco de duration elevada nos intermediários, onde a incerteza é maior. O horizonte aqui tende a ser híbrido: defensivo no curto prazo, oportunista no longo — mas sempre com a consciência de que o risco fiscal é um animal que muda de humor rapidamente.


Se eu pudesse resumir o aprendizado do dia, diria que a curva de juros é como um rio: ora caudaloso, ora sinuoso, sempre refletindo o terreno por onde passa. Quando as margens se alargam e os prêmios sobem, a mensagem não é de pânico, mas de prudência — e talvez de uma saudável desconfiança. Afinal, cada investidor precisa decidir por si: você está confortável com a travessia, ou prefere aguardar águas mais calmas? Assim, o segredo não está em seguir o fluxo cego, mas em aprender a ler as correntezas e escolher, com autonomia, o melhor ponto para lançar sua âncora.

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