Juros Futuros e Curva DI: O Sinal Escondido na Busca por Cortes e Seu Efeito na Renda Fixa
No pregão de hoje, a curva de juros futuros revelou um bull flattening expressivo, sugerindo que o mercado já está um passo à frente do Copom e atento ao menor prêmio exigido nos vértices longos. Descubra como essa dinâmica pode transformar sua leitura sobre renda fixa e identificar assimetrias para alocação.
O fechamento desta terça-feira nos contratos futuros de DI trouxe uma fotografia clara, mas cheia de nuances: as taxas caíram em todos os vencimentos, com impacto bem mais forte nos contratos de longo prazo. O DI out/2025 recuou marginalmente para 14,903% (-0,02%), mas o out/2026 já registrou queda mais acentuada, para 14,245% (-0,21%). O movimento ganhou velocidade nos vértices seguintes: out/2027 caiu para 13,345% (-0,52%), out/2028 para 13,085% (-0,57%) e out/2029 para 13,145% (-0,72%). O mercado praticamente descartou qualquer surpresa na reunião do Copom amanhã — 99% de chance de manutenção dos juros — e deslocou todo o foco para a mensagem do comunicado, especialmente qualquer pista sobre cortes em 2026. Esse tipo de comportamento, em que a ansiedade se transfere do presente para o futuro, sempre me lembra de quando, tempos atrás, participei de uma reunião onde todos já sabiam a decisão, mas ninguém ousava perder uma vírgula do que seria dito depois. Às vezes, o que não é dito pesa mais.
As forças externas contribuíram para esse fechamento alongado: a expectativa do corte de juros pelo Fed criou um ambiente global mais acomodatício, permitindo que o Brasil pense em relaxar sua política monetária sem colocar tanta pressão sobre o câmbio. Isso, na prática, diminui o prêmio de risco exigido para papéis longos, facilitando a queda das taxas nos vértices mais distantes. No entanto, internamente, o quadro é mais ambíguo. Dados robustos do mercado de trabalho mantêm acesas as preocupações com inflação de serviços, ancorando as taxas curtas em níveis ainda elevados. Em contrapartida, a sinalização — mesmo que polêmica — do Ministro da Fazenda defendendo o compromisso fiscal atuou como um bálsamo temporário, reduzindo o prêmio de risco fiscal e permitindo o fechamento mais forte da curva longa. Essas duas forças, opostas no tempo e na direção, compuseram o cenário típico de bull flattening: taxas curtas quase estáveis, longas em queda acentuada.
Tecnicamente, a inclinação da curva reforçou essa leitura. No trecho curto (out/2026 contra out/2025), o spread ficou ainda mais negativo, de -63,10bps para -65,80bps, sinalizando uma leve intensificação do flattening — o mercado segue apostando que o ciclo de cortes não começa já, mas se aproxima no horizonte. No médio prazo, a inclinação entre out/2027 e out/2026 ampliou o flattening, de -86,00bps para -90,00bps, indicando que, à medida que avançamos no tempo, a expectativa de normalização dos juros ganha corpo, mas com o condicional do Copom. Já na ponta longa (out/2029 vs. out/2028), o spread diminuiu de +8,00bps para +6,00bps, mostrando que, mesmo no horizonte mais distante, o prêmio de risco estrutural e fiscal foi suavizado, provavelmente pela conjunção de fatores externos mais benignos e a retórica fiscal doméstica. O formato do dia foi um clássico bull flattening: a curva ficou menos inclinada, com os vértices longos cedendo mais do que os curtos, mas sem sinais de inversão ou de barriga pronunciada.
Curiosamente, a precificação quase unânime de manutenção da Selic amanhã revelou uma tensão sutil: o mercado não está preocupado com o presente, mas com o que será sinalizado para 2026. Essa busca por pistas sobre o início do ciclo de cortes, mesmo com o Banco Central ainda em modo restritivo, revela uma antecipação dos fluxos e uma assimetria interessante — o mercado parece disposto a apostar que, passada a tempestade inflacionária, há espaço para um alívio mais cedo do que os discursos oficiais sugerem. Se o comunicado do Copom vier mais dovish, a curva longa pode fechar ainda mais; se vier duro, o movimento de hoje pode ter sido prematuro. O pano de fundo permanece de cautela: inflação persistente e risco fiscal elevado ainda rondam o horizonte, mas, com a trégua momentânea do cenário global e um aceno fiscal, o prêmio exigido caiu. Vale notar, porém, que essa convicção não é à prova de revisões rápidas — basta um dado de inflação ou uma fala menos conciliatória para reverter parte do fechamento.
Diante desse bull flattening, a abordagem de alocação que mais faz sentido é ancorada na forma do movimento: quando os vértices longos cedem bem mais que os curtos, a estratégia "barbell" ganha destaque para o investidor informado. Isso significa combinar títulos pós-fixados curtos, como Tesouro Selic, para preservar capital e aproveitar o carrego elevado enquanto a Selic permanece parada, com uma dose tática de títulos prefixados ou atrelados à inflação de prazo mais longo, que capturam o fechamento da curva e se beneficiam de eventual confirmação do cenário benigno para 2026. O racional aqui é o seguinte: se a antecipação do mercado se mostrar acertada e a curva continuar fechando na ponta longa, o ganho de capital desses papéis pode ser expressivo; se houver reversão por deterioração fiscal ou inflação inesperada, a parcela pós-fixada protege a carteira e oferece flexibilidade. Para quem tolera menos volatilidade, a simples manutenção em pós-fixados segue válida, mas a assimetria criada hoje sugere que, para o investidor que busca oportunidades, vale monitorar sinais de confirmação ou reversão vindos do Copom e dos dados fiscais.
Como reflexão final, o pregão de hoje ensina que, muitas vezes, o verdadeiro sinal está naquilo que quase passa despercebido: a ansiedade coletiva não pelo que será decidido agora, mas pelo que pode estar por vir. O investidor atento aprende a ouvir o silêncio dos comunicados e a decifrar os movimentos da curva como quem lê entrelinhas em uma carta cheia de subentendidos — e nisso reside a arte de transformar informação em estratégia.
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