26 de setembro de 2025

Juros Futuros e a Curva de DI: O Sinal do Bull Flattening e as Estratégias para Renda Fixa em Tempos de Tensão

A dinâmica dos contratos DI hoje revelou um achatamento técnico na curva, sinalizando otimismo cauteloso com o exterior, mas demonstrando uma fragilidade estrutural que pode ser revertida a qualquer ruído fiscal. Um olhar atento sobre a inclinação ajuda a antever o que está – e o que pode estar – sendo precificado.

O fechamento dos principais contratos de juros futuros nesta sexta-feira trouxe uma fotografia peculiar do humor do mercado: enquanto o vértice mais curto (out/2025) permaneceu praticamente inalterado, os contratos intermediários e longos recuaram de forma mais expressiva. O DI para out/2026 caiu 24 pontos-base, para 14,305%, seguido por uma queda de 48 pontos-base no out/2027 (13,45%). Os vértices de out/2028 e out/2029 também fecharam, embora com recuos mais discretos, para 13,23% e 13,31%, respectivamente. O movimento de bull flattening – aquela clássica queda das taxas longas enquanto o curto permanece estável – acabou desenhando uma curva que desafia as leituras lineares e exige um olhar mais atento para os sinais não tão óbvios. Lembro de um velho gestor que dizia: “Curva de juros não é régua — é sismógrafo; às vezes, ela treme antes do terremoto.” Hoje, senti esse eco na tela.


Esse comportamento foi, em grande medida, influenciado pelo ambiente externo. O dado de inflação (PCE) nos EUA, vindo em linha com as expectativas, trouxe alívio às taxas dos Treasuries e, por consequência, ao risco global de juros. O reflexo imediato foi a reprecificação dos prêmios de risco embutidos na curva brasileira, em especial nos vértices intermediários e longos, que se mostraram mais sensíveis ao humor externo do que ao cenário doméstico. Do lado interno, a calmaria relativa no noticiário fiscal, apesar das discussões sobre o cumprimento das metas e incentivos setoriais, serviu apenas como pano de fundo, sem força para inverter o vetor principal do dia.


Olhando tecnicamente para a inclinação, o dia foi marcado por uma diminuição dos spreads no curto e médio prazo: o spread entre out/2026 e out/2025 ficou ainda mais negativo (-59,90bps), aprofundando em 3,5 pontos-base o flattening nesse trecho. No médio prazo, a diferença entre out/2027 e out/2026 também caiu, chegando a -85,50bps, com um flattening adicional de 3 pontos-base. Já no longo prazo, houve uma leve abertura do spread entre out/2029 e out/2028 (+8,00bps), sugerindo que, embora o mercado tenha reduzido prêmios em quase toda a curva, ainda existe alguma precaução embutida nos vértices mais distantes. Em termos de forma, a curva resultante é achatada do curto ao médio e levemente encurvada no extremo longo — um “flattening com calombo”, se me permite a licença poética. Esse padrão sinaliza que o mercado, no momento, confia mais na convergência inflacionária no médio prazo do que em cortes de juros já no curto, enquanto mantém o radar atento para riscos de longo prazo.


Essa configuração da curva parece escancarar uma tensão estrutural: de um lado, a política monetária segue rígida, mantendo o trecho curto ancorado; de outro, o alívio externo permitiu um fechamento dos vértices longos, mas essa paz é condicional e pode se evaporar a qualquer sinal de deterioração fiscal. Ou seja, a curva está “quebrada” — cada trecho responde a um driver distinto e, por isso, a convicção é limitada. O mercado parece precificar que, se o ambiente externo seguir benigno e o fiscal doméstico não piorar, poderemos ver uma continuidade do fechamento nos prazos intermediários. No entanto, qualquer ruído fiscal relevante tende a reverter rapidamente esse movimento, abrindo a parte longa da curva num movimento de bear steepening. Assim, a precificação atual sugere que há mais espaço para ajustes táticos do que para apostas direcionais pesadas.


Diante dessa fotografia, a abordagem de alocação que julgo mais instrutiva hoje é justamente aquela ancorada na forma do movimento da curva — o bull flattening. Esse achatamento, típico de cenários onde a confiança no médio prazo aumenta, mas o curto prazo segue travado, sugere que títulos pós-fixados curtos (Tesouro Selic, CDBs DI) ainda são os instrumentos de maior resiliência para investidores que priorizam proteção e liquidez. A estabilidade recente dos vértices curtos reforça a atratividade deste carrego enquanto o BC mantém o compasso apertado. Já para quem busca assimetria e tem apetite a volatilidade, o fechamento dos vértices intermediários — se for lido como o início de uma reprecificação estrutural, e não apenas um ajuste técnico — pode abrir espaço para pequenas apostas táticas em prefixados longos, sempre atento à possibilidade de reversão rápida caso o fiscal volte ao centro do palco. Para o investidor atento, a curva de hoje não é convite à inércia, mas ao jogo de cintura: manter a base defensiva, calibrar o risco das apostas e, acima de tudo, respeitar a mensagem ambígua que o mercado está enviando.


No fim do dia, navegar pelas ondas dos juros é mais arte do que ciência — e, como em todo bom ofício, o segredo não está em prever para onde sopra o vento, mas em ajustar as velas com inteligência diante das correntes que se apresentam. O mercado fala em sinais sutis; cabe a cada um afinar o ouvido e decidir até onde arriscar no compasso da incerteza.

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