29 de setembro de 2025

Juros Futuros Disparam nos Longos e Revelam Sensibilidade: Curva DI Expõe Prêmio de Risco e Tensão Fiscal

Movimento da curva de juros futuros mostra como qualquer sinal de pressão inflacionária ou incerteza fiscal pode alterar rapidamente a dinâmica da renda fixa. Entenda como ler, interpretar e agir diante de um cenário tão reativo.

Quando o mercado parece tranquilo, geralmente é aí que se esconde a verdadeira tensão — e foi exatamente esse o sentimento que permeou o fechamento dos contratos de juros futuros hoje. No início do pregão, parecia que teríamos mais um dia de alívio: as projeções de inflação divulgadas no Focus animaram e as taxas abriram em queda, até que um dado sobre o mercado de trabalho virou a maré. O Caged de agosto trouxe a criação de 147.358 vagas, abaixo do esperado, mas o detalhe é que, mesmo assim, o número reforçou a ideia de um emprego ainda aquecido. Esse pequeno desvio foi suficiente para que as taxas virassem para cima, especialmente nos vencimentos mais longos, em um movimento que deixou clara a sensibilidade do mercado a qualquer ruído inflacionário ou fiscal.


Nos dados de fechamento, os contratos futuros DI com vencimento em outubro de 2025 ficaram praticamente estáveis (14,904%), mas os vértices seguintes sofreram aumentos relevantes: outubro de 2026 avançou 0,31%, outubro de 2027 saltou 0,59%, outubro de 2028 subiu 0,60% e outubro de 2029, 0,41%. O destaque ficou para a parte intermediária e longa da curva, onde a pressão foi mais sentida. Curiosamente, esse movimento de alta nas taxas ocorreu ao mesmo tempo em que o dólar recuava — uma divergência clara entre juros e câmbio, sugerindo que os fatores domésticos dominaram completamente o humor do mercado de renda fixa, enquanto o câmbio ainda se beneficiava de um ambiente externo mais ameno.


Essa leitura encontra eco na minha experiência prática: já presenciei dias em que o mercado se fixava em um único detalhe do noticiário e, como uma pedra jogada num lago calmo, as ondas se espalhavam de forma desproporcional. Hoje, bastou um dado de emprego considerado apenas "ok" para reacender o velho temor de que um mercado de trabalho resiliente pode reacender a inflação, forçando o Banco Central a ser mais duro por mais tempo. Some-se a isso a sinalização do TCU sobre as metas fiscais e tem-se o combustível para a abertura dos prêmios de risco nos vértices longos.


Tecnicamente, a curva apresentou alterações interessantes no seu perfil de inclinação. No curto prazo, o spread entre outubro de 2025 e outubro de 2026 reduziu a inclinação negativa, subindo 4,5 pontos-base — um leve "steepening", normalmente associado a uma reprecificação das expectativas de queda dos juros, ou pelo menos uma diminuição no otimismo sobre cortes próximos. No médio prazo, a inclinação entre outubro de 2026 e outubro de 2027 também ficou menos negativa (+3,5bps), refletindo um ajuste de expectativas quanto à velocidade de normalização da Selic e, possivelmente, uma visão de inflação mais persistente. Já no trecho longo, entre outubro de 2028 e outubro de 2029, houve um leve achatamento (-2,5bps), mas ainda com taxas elevadas e um spread positivo, o que sugere que grande parte do risco fiscal já está embutido nos prêmios desses vértices, mas não há alívio à vista.


A forma da curva do dia pode ser descrita como "barriga" — taxas altas e com inclinação ascendente nos intermediários, enquanto o trecho curto estaciona e o longo se estabiliza em patamares elevados. Esse formato costuma indicar uma combinação de dúvidas sobre o corte de juros no curto prazo (cautela do BC) e percepção de riscos estruturais no horizonte fiscal. O detalhe é que, ao mesmo tempo em que o dólar caía, a curva de juros ignorou o alívio externo, reforçando a tese de que o desafio está dentro de casa — e que a confiança fiscal é o principal vetor de volatilidade para os DI neste momento.


O movimento de hoje revelou uma tensão explícita entre o esforço de política monetária restritiva e a persistente incerteza fiscal. O BC, ao manter a postura firme contra a inflação, consegue ancorar parcialmente os vértices mais curtos da curva; porém, o mercado parece desconfiar que, diante de sinais de aquecimento do emprego e ruídos nas metas fiscais, esse esforço pode não ser suficiente para domar a inflação estrutural. Isso se traduz em prêmios elevados nos vencimentos intermediários e longos. O mercado parece estar precificando, com alguma probabilidade, o risco de que a Selic fique alta por mais tempo e que a convergência da inflação demore a se consolidar — especialmente se o quadro fiscal não trouxer novidades positivas. Caso surjam sinais concretos de ajuste fiscal, poderíamos ver uma reprecificação para baixo dos vértices longos; se, ao contrário, crescer a percepção de descontrole, novas pressões podem surgir, tornando a curva ainda mais inclinada ou até mesmo levando a movimentos abruptos (twists).


Diante desse cenário, a abordagem de alocação que faz mais sentido hoje é aquela ancorada justamente na forma da curva — a "barriga" evidente nos intermediários e longos. Para o investidor que busca proteger seu patrimônio, o recado do mercado é claro: títulos pós-fixados de curto prazo (Tesouro Selic) continuam sendo o porto seguro diante da incerteza sobre cortes de juros e da chance de manutenção da Selic em patamar elevado. Já para quem tolera um pouco mais de risco e acredita que, em algum momento, o fiscal pode melhorar ou o ciclo de cortes retomar força, os títulos prefixados longos e NTN-Bs com vencimentos intermediários embutem prêmios elevados e podem capturar bons ganhos se houver uma reversão do pessimismo. Por outro lado, para o perfil conservador, a curva de hoje sugere cautela com a exposição a duration longa, privilegiando liquidez e flexibilidade. O importante é entender que a curva está mandando um sinal: o prêmio existe, mas só quem suporta a volatilidade e monitora atentamente o risco fiscal pode pensar em capturá-lo sem perder o sono.


No fim do dia, o mercado de juros é como um sismógrafo: mesmo as menores vibrações nos fundamentos domésticos são amplificadas na curva. O segredo é saber ouvir esses sinais, sem se deixar paralisar pelo ruído. Afinal, a diferença entre especulação e estratégia está em entender que, em renda fixa, o prêmio só existe para quem se dispõe a atravessar a neblina — mas sempre sabendo onde está o chão firme.

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