Curva de Juros Futuros Fecha Partida: “Twist” Expõe Desconfiança no Curto Prazo e Abre Oportunidades Táticas na Renda Fixa
Oscilação entre cautela doméstica e alívio externo cria cenário peculiar para os juros DI; entenda como a leitura da curva pode orientar seu posicionamento em renda fixa.
Hoje, ao olhar para os números finais dos contratos de juros futuros DI, tive a sensação de estar diante de uma paisagem dividida, como se a estrada da renda fixa tivesse encontrado, de repente, dois caminhos opostos. Os vértices curtos e médios da curva subiram: contratos para out/2025 fecharam em 14,91% (+0,03%) e out/2026 em 14,23% (+0,11%), enquanto o vértice de out/2027 saltou ainda mais, para 13,39% (+0,30%). Mas, do meio para a longa, o humor virou: out/2028 cedeu para 13,18% (-0,19%), e out/2029 caiu levemente, para 13,31% (-0,04%). Essa “torção” (twist) da curva, que já vi acontecer em dias de incerteza política aguda, sempre me fez lembrar da importância de olhar além do número seco e buscar o que está sendo, de fato, precificado.
A fotografia do pregão revela, de um lado, um vento internacional favorável: a queda dos juros dos Treasuries americanos de 10 anos, puxada por apostas de afrouxamento do Fed, serviu como âncora e alívio para os vértices longos da curva DI brasileira. Isso foi especialmente importante para papéis de duration longa, como os fundos imobiliários, que encontraram suporte nesse movimento global por menor prêmio de risco nos prazos mais extensos. Ao mesmo tempo, a realidade doméstica impôs seu peso: a proximidade da retomada do julgamento do ex-presidente Bolsonaro no STF e a persistente percepção de ruído fiscal aumentaram a aversão ao risco. Como consequência, o prêmio exigido para carregar posições em prazos curtos e médios foi ampliado, impedindo que a curva como um todo acompanhasse a bonança externa. O resultado foi uma curva “rachada”: o risco Brasil concentrou-se nos vencimentos mais sensíveis ao noticiário político imediato, enquanto a parte longa respirou sob influência internacional.
No terreno da análise técnica, a inclinação da curva oferece pistas valiosas. No curto prazo (spread out/2026 – out/2025), houve um leve steepening (+1,10bps). Isso sugere que, apesar do patamar alto, o mercado ampliou marginalmente o prêmio para o risco de manutenção ou até elevação dos juros no curtíssimo prazo, refletindo uma incerteza adicional quanto à capacidade do Banco Central de conduzir o ciclo em meio a turbulências políticas. No médio prazo (spread out/2027 – out/2026), o alargamento do spread (+2,50bps) indica que o desconforto se estende para além das próximas reuniões do Copom, sinalizando dúvidas quanto ao ritmo e à profundidade do ciclo de cortes, além de possíveis revisões para cima da inflação projetada. Já na ponta longa (spread out/2029 – out/2028), o ganho de inclinação (+2,00bps) reforça que, mesmo com a queda das taxas absolutas, houve uma leve reprecificação do prêmio de risco estrutural — possivelmente ligada à percepção de que o alívio externo pode não ser suficiente para compensar riscos fiscais domésticos no horizonte mais distante. A forma resultante é um típico “twist”: a curva se parte, com trechos curtos pressionados para cima, trechos longos cedendo, e uma barriga saliente ao redor dos vencimentos intermediários. Essa configuração reflete incerteza elevada, mas também a disposição do mercado em diferenciar riscos de curto e longo prazo, ao invés de precificar um cenário homogêneo.
A divergência de hoje, em que a ponta curta resiste à queda e a longa acompanha o alívio global, escancara a tensão entre a política monetária contracionista e as incertezas fiscais e políticas. Não é todo dia que o mercado aceita “comprar” o otimismo externo, mas exige, ao mesmo tempo, um prêmio extra para navegar as águas turvas do noticiário doméstico. Esse tipo de movimento me faz pensar naquela máxima de que o investidor brasileiro precisa, mais do que nunca, ser um acrobata entre duas cordas: a do risco país imediato e a do cenário internacional. O mercado, ao que tudo indica, precificou hoje que a política monetária segue firme — mas admite que, se o ruído fiscal e político persistir, será difícil destravar cortes mais agressivos na Selic. Caso o ambiente externo continue favorável e o cenário político doméstico se estabilize, poderíamos ver um fechamento sincronizado da curva. Por outro lado, se a instabilidade ganhar corpo, o prêmio exigido nos vértices curtos e médios tende a pressionar novamente, inaugurando um período em que a renda fixa exige ainda mais seletividade.
É justamente a leitura desse “twist” na curva que pode inspirar abordagens de alocação mais inteligentes. Num cenário como o de hoje, a estratégia de “barbell” (halteres) ganha relevância: combinar títulos extremamente líquidos e seguros na ponta curta — como Tesouro Selic ou CDBs de liquidez diária — para proteger a carteira do risco imediato e, ao mesmo tempo, buscar oportunidades nos vértices longos, onde a queda das taxas sugere espaço para valorização, especialmente para quem tolera mais volatilidade. Essa abordagem permite capturar o melhor dos dois mundos: segurança no curto prazo, aproveitando o prêmio elevado, e potencial de ganho na duration, caso o cenário externo permaneça benigno ou surpresas positivas domésticas se materializem. Para perfis mais conservadores, o sinal do dia sugere cautela com duration: manter o foco em pós-fixados, evitando alongar prazos sem necessidade, pode ser prudente enquanto a incerteza política não se dissipa. Já para quem enxerga valor na queda das taxas longas, títulos prefixados ou atrelados ao IPCA de vencimentos distantes podem ser considerados, sempre ponderando o risco de reversão caso haja novas rodadas de estresse fiscal.
Cada investidor precisa, acima de tudo, alinhar suas decisões ao próprio perfil de risco e objetivos financeiros. O cenário de hoje ilustra como a leitura diária da curva DI pode servir tanto de termômetro quanto de bússola para navegar um mercado em que o prêmio de risco não é distribuído igualmente ao longo do tempo. Se você está começando ou se sente inseguro diante de tanta complexidade, buscar a orientação de um profissional qualificado é fundamental antes de tomar qualquer decisão. Afinal, no mundo da renda fixa, tão importante quanto entender os números é reconhecer o contexto e agir com estratégia.
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