7 de outubro de 2025

Curva de Juros Futuros Eleva Prêmio Fiscal e Redefine Estratégias: O Que o DI de Hoje Revela Sobre Renda Fixa e Risco

No pregão de hoje, a curva de juros futuros brasileira mostrou um recado claro: a sustentabilidade fiscal voltou ao centro do palco, com os vértices longos estressando em plena calmaria dos Treasuries. Entenda como esse movimento influencia sua tomada de decisão em renda fixa.

Assim que o sino do mercado soou o fim do pregão, os números da curva DI saltaram aos olhos de quem acompanha de perto o termômetro dos juros no Brasil. Os contratos mais curtos, como o DI nov/25, tiveram leve queda de 0,03% — um movimento quase imperceptível, especialmente diante da estabilidade recente da taxa DI over. No entanto, a história de hoje se desenrolou nos vértices intermediários e longos: o DI out/26 subiu 0,17%, o out/27 acelerou 0,44%, o out/28 avançou 0,59% e o out/29 disparou 0,88%. Em outras palavras, enquanto o curto prazo permaneceu ancorado, a parte longa da curva foi pressionada para cima, sinalizando que o mercado atribuiu um prêmio extra ao risco de carregar títulos de prazo mais dilatado — e não por influência internacional, mas por nervosismo local.


Lendo nas entrelinhas, o ambiente externo até trouxe ingredientes clássicos de aversão ao risco, com o impasse orçamentário nos EUA (shutdown) gerando volatilidade e fuga de ativos emergentes. Curiosamente, os yields dos Treasuries americanos cederam, indicando uma busca global por proteção e até alguma leitura de que o próprio Fed pode ser obrigado a suavizar sua postura no futuro. Mas, mesmo com esse pano de fundo que, em geral, contribuiria para alívio nos mercados locais, o Brasil foi na contramão: o dólar subiu forte, a bolsa recuou e os DIs longos dispararam. Isso sugere que o estresse de hoje teve DNA doméstico. As declarações do ministro Fernando Haddad sobre possíveis mudanças na gratuidade do transporte público, somadas à indefinição sobre a arrecadação da nova MP que substitui o IOF, pressionaram a percepção de risco fiscal — principalmente porque, em países emergentes como o nosso, ruídos fiscais rapidamente se tornam pólos de atração para prêmio de risco na curva de juros.


Olhando para a anatomia técnica da curva, o que chama atenção é o alargamento dos spreads em praticamente todos os trechos. Entre nov/25 e out/26, o spread subiu 2,9 bps, sugerindo um leve “steepening” no curto prazo, mas ainda dentro da normalidade para uma curva ancorada na política monetária. No médio prazo, entre out/26 e out/27, o spread aumentou 3,5 bps — sinalizando que o mercado enxergou maior risco de deterioração fiscal contaminando o horizonte de inflação e Selic intermediária. Já no trecho mais longo, entre out/28 e out/29, o spread saltou 4 bps, ampliando o prêmio exigido para carregar risco Brasil no horizonte mais distante. A curva, portanto, ganhou uma inclinação ascendente a partir dos vértices intermediários, desenhando o que costumo chamar de “curva com barriga alta” — aquela em que a preocupação de médio e longo prazo supera qualquer alívio pontual de curto prazo. Esse padrão, reforçado por uma divergência notável com os Treasuries — que recuaram no dia —, é a materialização gráfica do que o mercado está sentindo: um desconforto fiscal que não depende da maré global.


Chegando ao ponto central, a performance da curva de hoje é praticamente um espelho da tensão que existe entre a tentativa de contenção monetária e a inquietação fiscal. Enquanto o Banco Central reforça sua postura vigilante, buscando preservar expectativas de inflação e dar credibilidade à ancoragem da Selic, o prêmio de risco exigido para os prazos mais longos salta diante de ruídos e incertezas sobre a trajetória das contas públicas. Ou seja, a mensagem da curva é que, por mais que o BC tente segurar as pontas no curto prazo, a desconfiança fiscal já começa a precificar não apenas um risco de inflação futura, mas também um custo de financiamento estruturalmente mais alto. Caso essa incerteza persista — especialmente se o governo não oferecer sinais concretos de ajuste ou reequilíbrio fiscal —, poderemos ver a curva longa se manter pressionada, com impactos diretos sobre o custo de rolagem da dívida, confiança dos agentes e, em última instância, sobre a própria condução da política monetária. Por outro lado, se houver alguma sinalização crível de ajuste nas próximas semanas, a curva poderia suavizar parte desse prêmio, trazendo algum alívio para os vértices mais longos.


Diante desse cenário, uma abordagem de alocação que me parece especialmente relevante — e que costumo revisitar sempre que a curva “entorta” por razões fiscais — é ancorar a estratégia na dinâmica da inclinação. O steepening detectado hoje, especialmente no trecho médio-longo, sugere um ambiente favorável para a montagem da chamada “estratégia de barra” (“barbell”). Isso significa combinar posições relevantes em pós-fixados de altíssima liquidez e duration curta — como Tesouro Selic e CDBs de curto prazo, que seguem capturando o juro elevado sem exposição ao risco de marcação a mercado — com uma fatia menor, porém relevante, em prefixados ou IPCA+ de vencimentos bem longos. A ideia é aproveitar o prêmio de risco elevado que esses títulos oferecem, já que embutem o temor fiscal exacerbado de hoje (mas que pode ser reprecificado em caso de melhora do quadro). Essa estratégia equilibra proteção e oportunidade, pois permite capturar ganhos táticos nos juros curtos e, simultaneamente, manter uma opção de valorização nos longos, caso o mercado reavalie o risco fiscal. Vale ressaltar que, nesse tipo de ambiente, títulos de crédito privado perdem espaço — o prêmio de risco fiscal costuma contaminar rapidamente o risco de crédito, tornando ativos públicos mais defensivos e líquidos a escolha preferencial enquanto o cenário estiver turbulento.


Hoje, ao observar a curva DI “abrindo” no longo enquanto o resto do mundo respirava aliviado, lembrei de uma conversa que tive, anos atrás, com um gestor veterano: “No Brasil, o fiscal é como uma nuvem carregada no horizonte — às vezes parece distante, mas basta um trovão para todos correrem para o abrigo.” O pregão de hoje ecoa esse ensinamento: mesmo quando o céu lá fora clareia, a tempestade pode ser local.


No fim das contas, a curva de juros é um mosaico de expectativas, receios e apostas — e, como em qualquer mosaico, é preciso olhar as peças de perto e de longe para enxergar o desenho inteiro. Será que o prêmio fiscal vai persistir, ou estamos diante de um exagero passageiro? A resposta, como sempre, está menos em adivinhar o futuro e mais em saber ler os sinais que o presente oferece.

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