Juros Futuros e Renda Fixa: Bull Steepening na Curva DI Sinaliza Otimismo Cauteloso com o Longo Prazo
A queda seletiva nos juros futuros revela um alívio nos prêmios de risco de longo prazo, mas deixa em aberto a sustentabilidade desse movimento caso o cenário externo mude ou o fiscal doméstico volte ao radar. Entenda como a forma da curva DI pode informar escolhas inteligentes em renda fixa.
O fechamento do mercado de juros futuros hoje trouxe uma mensagem sutil, mas importante: a curva DI apresentou queda nas taxas, especialmente nos vértices intermediários e longos, enquanto o trecho mais curto ficou praticamente estável. Para ser mais concreto, os contratos de DI para out/2025 recuaram levemente (-0,02%), os de out/2026 caíram um pouco mais (-0,03%), e a queda foi ganhando corpo para out/2027 (-0,07%), out/2028 (-0,30%) e, finalmente, out/2029 (-0,45%). Ao olhar para esses números, fica claro que o movimento não foi uniforme, mas concentrou o alívio nos prazos mais distantes — uma fotografia típica de “bull steepening”. Ou seja, a parte longa da curva cedeu mais, enquanto os curtos seguem ancorados na inércia da Selic.
Esse alívio na ponta longa teve uma origem bem definida: o pano de fundo internacional. O temor de um possível shutdown do governo dos EUA elevou a aversão ao risco global, gerando uma busca por ativos tidos como porto seguro — os famosos Treasuries. Como acontece nessas situações, a demanda extra pelos títulos americanos derrubou seus yields, abrindo espaço para os mercados emergentes experimentarem uma descompressão nos seus próprios prêmios de risco. No Brasil, esse efeito foi potencializado pela ausência de notícias domésticas negativas: desemprego estável e déficit primário dentro do esperado funcionaram como um “não-evento” construtivo, permitindo que a curva local importasse o otimismo externo sem obstáculos internos. Na prática, o ambiente doméstico não foi protagonista, mas permitiu que a influência externa se manifestasse plenamente no fechamento dos contratos DI.
No exame técnico da curva, a inclinação entre os vencimentos curtos (out/2026 versus out/2025) aumentou marginalmente (-0,2bps), sugerindo que as expectativas para o curto prazo permanecem presas à política monetária já contratada, sem sinais de flexibilização adicional iminente. Já no trecho intermediário (out/2027 versus out/2026), houve uma queda mais notável na inclinação (-0,5bps), sinalizando que o mercado embute algum otimismo com a dinâmica inflacionária e a trajetória futura da Selic, ainda que de forma comedida. O destaque, porém, ficou para o spread entre out/2029 e out/2028, que caiu 2bps, reforçando que o grosso do movimento foi mesmo na parte longa — reflexo direto do recuo dos prêmios de risco globais e, por tabela, do risco fiscal doméstico. O resultado é uma curva que, apesar de inclinada, mostra uma barriga de otimismo para o médio e longo prazo, típica de um bull steepening: não é uma reversão estrutural, mas um ajuste técnico na precificação dos riscos.
Hoje, o comportamento da curva colocou em evidência uma tensão interessante entre a política monetária restritiva e a melhora pontual na percepção de risco estrutural. O trecho curto, ainda dominado pelas mensagens do Banco Central sobre inflação e disciplina, permaneceu quase imóvel. Já o recuo mais forte nos vértices longos sugere que o mercado, ao menos por hoje, atribuiu maior peso a fatores externos do que às incertezas fiscais locais. Isso não exclui o risco: caso o ambiente externo piore ou surjam sinais de deterioração fiscal doméstica, o espaço para continuidade desse alívio se fecha rapidamente. Se a calmaria internacional persistir, há a possibilidade de mais compressão nos prêmios de risco de longo prazo, mas toda essa dinâmica segue dependente de variáveis voláteis — um lembrete de que, em juros, o vento muda rápido.
Nessa configuração, o investidor de renda fixa se vê diante de um cenário instigante para pensar alocação. A forma da curva — esse bull steepening com barriga pronunciada — costuma criar oportunidades para quem sabe explorar as nuances da duration. Abordagens “barbell”, combinando a segurança dos pós-fixados de curtíssimo prazo (Tesouro Selic) com posições táticas em vértices intermediários ou longos (Tesouro Prefixado 2027+ ou NTN-Bs longas), podem capturar o benefício do carrego elevado com alguma gordura para ganhos de marcação a mercado, caso o alívio no risco persista. Para quem é mais conservador, a estabilidade dos curtos reforça a lógica de preservar liquidez e esperar por sinais mais claros antes de alongar duration. Já o perfil mais arrojado pode cogitar estratégias que se aproveitam da assimetria: se o bull steepening for revertido por uma piora fiscal ou mudança brusca no exterior, a aversão ao risco pode rapidamente inflar os vértices longos novamente, abrindo espaço para operações táticas de proteção ou até apostas em aumento de inclinação (“steepeners”) via instrumentos derivativos.
No fim do dia, a curva de juros é como o horizonte visto de uma trilha de montanha: cada elevação ou descida revela não só o terreno atual, mas também as possibilidades e armadilhas à frente. O mercado de hoje lembrou que, por vezes, o melhor movimento é observar o que muda no entorno — e, quando o vento sopra a favor, ajustar as velas com inteligência, mas sem perder de vista o risco de tempestades repentinas. O investidor atento não busca certezas, mas oportunidades condicionais. Afinal, quem aprende a ler a curva, aprende a navegar por mares turbulentos com mais autonomia — e, por vezes, descobre atalhos que só os olhos treinados conseguem enxergar.
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