23 de setembro de 2025

Juros Futuros e Curva DI: Otimismo Tático de Longo Prazo Contrasta com Persistência na Selic

A dinâmica de hoje revelou uma curva de juros que se desdobra em dois tempos: um mercado que celebra a distensão do risco externo no longo prazo, mas permanece cauteloso e pragmático quando se trata da política monetária de curto prazo. Entenda como essa dicotomia pode transformar a forma de pensar sua alocação em renda fixa nos próximos meses.

Quando olho para a fotografia do fechamento de hoje no mercado de juros futuros, o contraste é quase cinematográfico: enquanto os vértices longos da curva DI exibiram um recuo expressivo nas taxas – out/2027 em queda de 0,90% e out/2029 recuando 0,87% – a ponta curta (out/2025) ficou praticamente imóvel, com leve alta residual de 0,02%. Já out/2026 recuou 0,32%, mas ainda muito menos que os prazos mais longos. É como se o mercado estivesse com um olho no presente, outro no futuro – e, por ora, enxergando cenários bem diferentes. Não é raro ver esse tipo de comportamento em momentos de mudança de regime ou percepção de risco, mas sempre que acontece, me recordo de um gestor experiente dizendo: “O mercado de juros nunca fala em linha reta, mas hoje ele gritou em estéreo”.


Por trás desse movimento, dois grandes vetores se destacaram. No cenário externo, a queda dos juros dos Treasuries americanos diluiu a pressão sobre o prêmio de risco exigido nos mercados emergentes, permitindo que o Brasil “surfasse” uma onda de alívio que chegou primeiro nos vértices médios e longos. No plano doméstico, a notícia de uma relação diplomática menos turbulenta com os EUA diminuiu o risco de cauda associado ao cenário político e fiscal brasileiro. O resultado foi uma compressão relevante dos prêmios de risco de longo prazo, reduzindo a percepção de que, para financiar nossa dívida, seria preciso pagar um adicional tão elevado.


Tecnicamente, a leitura da inclinação da curva hoje reforça esse retrato dividido. No curto prazo, o spread entre out/2026 e out/2025 ficou ainda mais negativo (-61,9bps), ampliando-se em 4,8bps no dia – um sinal de “steepening” negativo, típico de um mercado que continua precificando Selic elevada por mais tempo, em linha com o tom ainda restritivo do Banco Central divulgado na ata do Copom. No médio prazo, a diferença entre out/2027 e out/2026 ampliou o distanciamento negativo para -90,5bps, com variação de -7,5bps, traduzindo uma percepção de que, embora o ciclo de queda dos juros possa vir, o timing e a intensidade permanecem cercados de dúvidas. O trecho longo da curva, por sua vez, mostrou uma redução do spread positivo entre out/2029 e out/2028 de 9bps para 7bps, movimento que sugere menor exigência de prêmio para carregar duration longa, graças ao alívio no risco estrutural externo e político. O resultado consolidado é o que os técnicos chamam de “bull steepening”: as taxas longas caem mais, a curva abre no meio, mas o curto segue ancorado, refletindo cautela no front imediato e otimismo condicional para prazos mais distantes. Não posso deixar de notar que, apesar da “festa” na parte longa, a ponta curta permaneceu descolada – um lembrete de que o mercado, por ora, não compra a tese de que a Selic pode cair rápido ou cedo.


Essa configuração montou um dilema interessante para o Banco Central. Ao mesmo tempo em que a melhoria do risco externo e político permite algum alívio nos vértices longos, a insistência da curva curta em permanecer elevada evidencia que o “mercado de DI” ainda enxerga obstáculos relevantes à frente: inflação persistente, fiscal pressionado e um BC que, apesar do discurso duro, enfrenta uma economia real em compasso de espera. Se o quadro externo se mantiver benigno e a agenda política doméstica continuar sem grandes choques, é provável que a parte longa da curva siga ganhando espaço para fechar ainda mais, ampliando as oportunidades para quem carrega duration. Por outro lado, qualquer ruído fiscal ou surpresa negativa de inflação pode reacender a cautela e interromper esse movimento. Em síntese, a curva sugere um jogo de paciência: para que o bull steepening se converta em rally generalizado, seria preciso que o curto finalmente “ceda” – o que, pelo menos hoje, ficou para outro capítulo.


Pensando em estratégias de alocação, o formato de bull steepening observado no fechamento cria um convite para abordagens assimétricas, especialmente para quem busca antecipar movimentos de fechamento nos vértices longos. Em um cenário em que o risco de longo prazo foi reprecificado para baixo sem que o curto acompanhe, títulos prefixados longos (Tesouro Prefixado 2027, 2029) tendem a se beneficiar duplamente: pelo carrego elevado já contratado e pelo potencial ganho de marcação a mercado se a curva continuar fechando. Ao mesmo tempo, para quem prefere prudência, manter uma parcela relevante em pós-fixados curtos (Tesouro Selic) protege contra eventuais reversões abruptas, especialmente se a inflação surpreender para cima ou o fiscal azedar. Uma abordagem interessante hoje seria a clássica “barbell”: um mix de pós-fixados curtíssimos para resiliência e prefixados longos para capturar valor, ajustando o tamanho da aposta conforme o seu próprio apetite ao risco e a leitura do cenário. O fundamental é perceber que a divergência entre pontas da curva oferece, ao investidor informado, a chance de se posicionar não apenas para o cenário base, mas para eventuais assimetrias de prêmio.


No fim das contas, a curva de juros é como um mosaico em movimento, cujas peças mudam de lugar ao sabor dos fluxos e dos riscos. Hoje, ela sussurrou mais do que gritou, mas para quem sabe ouvir, a mensagem é clara: em tempos de incerteza, pensar em cenários e manter flexibilidade pode ser o diferencial entre apenas acompanhar o mercado e realmente aproveitá-lo. Afinal, como já ouvi de um velho operador, “o prêmio está quase sempre escondido onde poucos têm paciência de procurar”. Você está olhando para a curva ou apenas para os números?

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