Juros Futuros: Curva de DI Inclina com Prêmio de Risco Político e Pressiona Estratégias de Renda Fixa
Mesmo com alívio vindo dos mercados internacionais, a curva de juros futuros brasileira reforçou a dominância do risco político doméstico, sinalizando desafios para quem busca previsibilidade em renda fixa.
Quando olho para um pregão como o de hoje, não consigo evitar a sensação de déjà vu: os ventos externos sopram para um lado, mas a bússola local insiste em outro. No fechamento, os principais contratos futuros de DI apresentaram alta em todos os vértices relevantes: o DI out/2025 subiu para 14,907% (+0,02%), out/2026 foi a 14,305% (+0,07%), out/2027 saltou a 13,45% (+0,22%), out/2028 fechou em 13,215% (+0,19%) e out/2029 em 13,31% (+0,23%). O movimento foi mais intenso justamente nos prazos mais longos, que são sempre os primeiros a captar o cheiro de incerteza no ar. O que chama a atenção, no entanto, não é apenas a direção — mas o fato de que as taxas por aqui não embarcaram no alívio global proporcionado pela queda dos yields dos Treasuries. Sabe aquele velho ditado de que “o Brasil não perde a chance de perder uma chance”? Pois bem, a curva de hoje é um gráfico desse sentimento.
Esse descasamento ficou cristalino ao longo do dia. O ambiente internacional, marcado pela queda dos juros dos EUA diante do arrefecimento do emprego e da expectativa de corte pelo Fed, abriu espaço para um alívio generalizado em emergentes. Por aqui, esse efeito até tentou se instalar, mas perdeu força à medida que o noticiário doméstico ganhou peso: a condenação do ex-presidente no STF e a nova pesquisa Datafolha elevaram o volume do ruído político. O resultado foi um aumento perceptível do prêmio de risco, especialmente na parte longa da curva, que parece ter virado uma espécie de barômetro imediato do humor institucional e das incertezas sobre a estabilidade do país.
Olhando para a inclinação da curva, o dia foi de steepening — aquela inclinação para cima que revela aumento dos spreads entre os vértices, especialmente no médio e longo prazos. O spread entre out/2026 e out/2025 ficou menos negativo (-60,20bps), mas ainda indica uma curva invertida no curto prazo, sugerindo alguma expectativa de queda da Selic mais à frente. Já entre out/2027 e out/2026, o spread também reduziu sua inclinação negativa para -85,50bps, apontando para uma ligeira diminuição do pessimismo no ciclo intermediário, mas ainda refletindo prêmios elevados. No longo, o spread positivo entre out/2029 e out/2028 subiu para +9,50bps, reforçando a percepção de que o risco estrutural permaneceu — e talvez até se agravou. No consolidado, temos uma curva com “calombo” nos trechos intermediários e longos, típica de cenários onde a incerteza fiscal e política joga mais peso na parte extensa do gráfico do que qualquer otimismo pontual no curto prazo.
É interessante perceber como, mesmo diante de uma política monetária ainda restritiva, a curva de hoje optou por desafiar qualquer sinal de “alívio” que viesse de fora. A persistência da abertura nos vértices longos, apesar da postura vigilante do Banco Central, revela uma tensão subjacente: enquanto a autoridade monetária busca ancorar expectativas, o mercado parece precificar a possibilidade de que os desafios institucionais e fiscais podem, na prática, limitar a eficácia desse esforço. Em outras palavras, se o ruído político não ceder e o risco fiscal continuar elevado, a curva sugere que poderíamos ver um alongamento do ciclo de juros altos, ou pelo menos uma hesitação maior para qualquer flexibilização mais clara. Caso, porém, o ambiente político se estabilize e o fiscal dê sinais concretos de controle, essa inclinação pode se reverter rapidamente, abrindo espaço para estratégias mais arrojadas em duration.
Diante desse cenário de curva inclinada, o investidor de renda fixa se vê num daqueles “crossroads” dignos de blues: avançar para buscar prêmios, ou esperar até a poeira baixar? Quando vejo a curva em “calombo”, costumo lembrar de uma conversa antiga que tive com um gestor experiente: “No Brasil, prêmio nunca é de graça; se está alto, é porque tem risco escondido”. O movimento de hoje sugere que estratégias de redução de duration fazem sentido; ou seja, priorizar títulos pós-fixados curtos (como Tesouro Selic) para quem valoriza liquidez e proteção, especialmente enquanto a volatilidade persistir. Para quem tem apetite e horizonte mais longo, os vértices intermediários e longos carregam prêmios tentadores, mas pedem uma análise criteriosa do risco — títulos indexados à inflação podem ser uma alternativa para proteger poder de compra caso o fiscal piore, mas a volatilidade tende a ser maior. Em cenários assim, a velha máxima do “barbell” (combinar liquidez curta com apostas táticas nos longos) pode ser uma forma de aproveitar oportunidades sem se expor demais ao incerto.
No fim das contas, a curva de juros é como um sismógrafo das ansiedades nacionais — e hoje ela captou mais tremores internos do que ventos externos. O desafio é ler esses sinais sem se perder no ruído. Em dias como este, pergunto: será que não é justamente a incerteza que nos ensina a pensar antes de agir? O investidor atento é aquele que transforma instabilidade em reflexão, e não em impulso.
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