22 de outubro de 2025

Ibovespa desafia Wall Street e embala alta: por que o “descolamento” pode ser só o começo para ações brasileiras

Mesmo com o clima negativo nas bolsas globais, o Ibovespa encontrou força em motores internos e sinalizou que, se a confiança fiscal se firmar, o mercado de ações pode reservar surpresas positivas para quem olha além do curto prazo.

No fechamento desta quarta-feira, o Ibovespa avançou para 144.873 pontos (+0,55%), acumulando mais um degrau em sua recente sequência de altas. O volume negociado, de R$ 18,11 bilhões, reforçou a convicção do movimento, que encontrou sustentação ao longo do dia entre a mínima de 144.039 e a máxima de 145.048. O que mais me chamou atenção – e talvez tenha faltado a muitos investidores que ficaram presos ao noticiário externo – foi o tom de “agenda própria” que a bolsa brasileira assumiu: mesmo com o S&P 500 caindo 0,53% e o VIX saltando 4%, o mercado doméstico simplesmente ignorou o mau humor global. Lembro de um velho gestor que dizia: “os mercados só se descolam quando há motivo de verdade, e não só ruído”. Hoje, esse motivo veio do front fiscal e das commodities.


O pano de fundo do dia teve dois protagonistas externos: Petrobras e Vale. A primeira subiu 1,15%, embalada pela disparada de quase 5% do petróleo Brent e pela notícia de novos blocos arrematados no pré-sal. Já a Vale saltou 1,78% após divulgar o melhor trimestre de produção de minério de ferro desde 2018, num movimento que foi rapidamente acompanhado por revisões positivas de analistas – mesmo que o minério em Dalian tenha ficado praticamente estável. Esses dois pesos-pesados, juntos, deram sustentação ao índice, mas o impulso decisivo veio de dentro de casa: a forte queda nas taxas dos juros futuros. O tom do Ministério da Fazenda, reafirmando o compromisso com déficit zero em 2025 e projetando superávit para 2026, ajudou a ancorar expectativas e reduziu o prêmio exigido pelos investidores – uma combinação que aumentou o valor presente das empresas, principalmente de setores sensíveis a juros, como construção civil, varejo e energia.


Tecnicamente, a fotografia do índice é de força: tendência de alta clara nos horizontes diário, semanal e mensal, confirmada pelo cruzamento das médias móveis (MME9, 21 e 50) e respaldada pelos indicadores de momentum. O Ibovespa não só fechou perto das máximas, como reforçou o padrão de continuação, exibindo um típico “momentum de alta”. Mas é no detalhe da divergência que se esconde um sinal sutil e importante: enquanto o Ibovespa subia, o S&P 500 cedia, e o VIX (indicador de volatilidade global) subia mais de 4%. Essa divergência entre ativos correlacionados – bolsas globais e o índice brasileiro – sugere que os vetores domésticos foram mais fortes que o risco externo, pelo menos por hoje. O dólar até ensaiou alta (+0,12%), mas o VXBR (volatilidade local) fechou em queda de -1,22% (14,57 pontos), evidenciando complacência e certo otimismo em relação ao risco Brasil. Um detalhe que não pode ser ignorado é que, em ambientes de volatilidade baixa, o mercado costuma subestimar riscos futuros, o que pode trazer movimentos bruscos caso o cenário se deteriore.


Gosto de pensar a fase atual da economia como um trem que começa a desacelerar ao se aproximar de uma estação importante. Para quem está nos vagões da frente – empresas mais expostas ao ciclo doméstico –, a redução do ritmo pode significar mais tempo para ajustar as bagagens e se preparar para um novo embarque. O recado do mercado, ao precificar uma queda expressiva nos juros intermediários (DI27 caindo 60 bps), é que talvez o maquinista – leia-se, o Banco Central – esteja disposto a aliviar os freios mais cedo do que se imaginava, caso as promessas fiscais se confirmem na prática. Se esse alívio continuar, poderíamos ver uma reprecificação mais ampla dos ativos de risco, principalmente das ações que hoje carregam um desconto estrutural por conta do ceticismo fiscal. Por outro lado, permanece o risco de o “descolamento” ser apenas temporário, caso a agenda política não entregue o que promete – uma lembrança de que, em mercados, a confiança é conquistada centímetro por centímetro, mas pode ser perdida em poucos milímetros.


Diante desse pano de fundo, vejo uma oportunidade assimétrica ancorada justamente na divergência entre o Ibovespa e os mercados globais. O argumento contrário mais ouvido hoje é que esse movimento de alta seria apenas um “alívio passageiro”, fadado a sucumbir caso o cenário externo piore ainda mais ou se o fiscal doméstico decepcionar. A tese alternativa, porém, parte da hipótese de que a melhora recente já precificou boa parte dos riscos e que o mercado pode estar subestimando o potencial de uma reprecificação positiva caso o compromisso fiscal se materialize. A assimetria está no fato de que, se os vetores internos continuarem a prevalecer, o fluxo de capital pode migrar para setores domésticos que ainda negociam a múltiplos deprimidos, enquanto o risco de reversão pode ser limitado por pontos técnicos claros.


O gatilho para materializar essa tese seria a confirmação de dois fechamentos consecutivos acima da máxima do dia (145.048), sinalizando que a força compradora não foi apenas pontual, mas sustentada. Com isso, a execução prática se daria pelo aumento tático de exposição a setores sensíveis à queda dos juros – construção civil, varejo e energia –, além de uma alocação incremental em ETFs de Ibovespa (como BOVA11) para capturar o movimento de reprecificação mais amplo caso o fluxo continue. A disciplina de saída – ou seja, o ponto de proteção – estaria no retorno do índice para abaixo da mínima do pregão atual (144.039), o que sugeriria perda do momentum e exigiria redução imediata de exposição, ou então na ocorrência de uma reviravolta no noticiário fiscal que minasse a confiança ancorada nos últimos dias.


Sintetizando: essa abordagem busca capturar um potencial de valorização mais expressivo, baseado na hipótese de que uma reavaliação estrutural do risco Brasil está apenas começando, com o risco de perda limitado e bem definido por critérios técnicos e disciplina macroeconômica.


No fim do dia, o mercado é uma espécie de espelho distorcido: às vezes ele reflete mais o que esperamos do que o que realmente está diante de nós. Meu convite é que você use essa análise não como um mapa, mas como uma lanterna – para iluminar possibilidades, questionar consensos e, sobretudo, construir sua própria trilha de decisão. Afinal, em mercados, o maior risco é navegar no piloto automático quando o cenário pede olhos bem atentos ao painel de controle.

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